quinta-feira, 5 de maio de 2016

Coluna do Heródoto - FLECHA DISPARADA

 Somos resistentes às mudanças. Elas nos incomodam, nos obrigam a um esforço extra. Se tudo está andando tão bem desse jeito, por que mudar? Devem existir no mundo uns duendes que não sossegam enquanto não encontram uma mudança para nos atazanar. O pior é que uma vez destravada a roda da mudança ela não para mais. Está conectada a outras engrenagens que também giram  e mudam o ambiente. Umas mudanças são mais simples, outras extremamente complexas. Mudaram a mão de direção no caminho da minha casa. Levou tempo para que eu me acostumasse com a troca, ainda que, lá no fundo, entendesse que era necessária  e que o trânsito melhorara depois que as placas foram trocadas. O advento da tecnologia digital é uma dessas rodas acopladas a um número inimaginável de engrenagens. Uma série enorme de atividades humanas em todos os campos foram afetadas e as reações também foram inúmeras. Não se trata de constatar um mecanicismo, mas a máxima que diz que uma vez disparada a flecha nada pode impedir que atinja o seu alvo. Não se pode voltar atrás no tempo e impedir que o arqueiro não lance a flecha. Uma vez na rota vai provocar uma mudança quer a gente queira quer não. Curioso é que a humanidade vem sendo avisada disso desde os tempos do Bagavad Gita.

Os taxistas foram atropelados pela tecnologia digital. A chegada dos aplicativos para se chamar um táxi foi recebida pelas cooperativas de rádio táxi como um ataque a um direito adquirido. Uma concorrência desleal. Com um simples toque na tela do smart phone é  possível chamar o táxi, saber onde está, se chegou, o nome do profissional, a placa e pagar com cartão de crédito. Ao sair do carro  é possível ler o recibo e uma avaliação da viagem. Os aplicativos melhoraram o faturamento dos taxistas  em pelo menos 30 por cento. Ajudam o passageiro a encontrar o táxi e vice versa. Com isso os pontos de táxis estão vazios e as mudanças foram boas para ambos. Contudo elas não  pararam por aí . Outra engrenagem se pôs a rodar e surgiu  o aplicativo uber. Nova reação  dos taxistas em todo o mundo. Talvez só comparável quando as carruagens de aluguel puxadas por cavalos  foram batidas pelos carros com motor à gasolina. Os carroceiros perderam a batalha, os cavalos foram para os estábulos e o produtor de fraldas para cocô de cavalo faliu. Fazer o quê? As acusações contra o novo aplicativo é a mesma : concorrência desleal. Quais serão os lances dessa disputa entre o passado e o presente? Não tenho a menor idéia. No entanto há inúmeros exemplos em que o passado perdeu. Vem aí o aplicativo para compartilhamento de carros particulares, como se compartilha bicicletas em grandes cidades. Muitas outras engrenagens estão girando.

A informática também incomodou o modorrento poder judiciário. Tanto como ferramenta de trabalho como ré. A digitação está ajudando mover os processos, ainda que a velocidade esteja muito  aquém  da desejável pela sociedade. Não é possível  os processos se arrastarem por décadas, amarrados em resmas de papéis empilhadas em cartórios e fóruns. Graças a informatização a velocidade aumentou, encontrar um documento no meio do cipoal de petições melhorou. E as pessoas comuns que tinham medo de se aproximar de um cartório ou vara judicial, hoje podem fazer consultas sobre o andamento de processos de seu interesse na internet. Os advogados se sentiram incomodados. Assim como os médicos que torcem o nariz quando o paciente confessa que já consultou o Doutor Google. Alguns aplicativos foram usados para o mal. Internautas pedófilos, racistas, sexistas, homo fóbicos foram identificados. No entanto a Justiça ainda não avaliou corretamente a importância das redes sociais. Impossibilitada de punir um pedófilo resolveu punir o aplicativo e deixar  cem milhões de pessoas sem comunicação via what´s app. Certamente o juiz não sabe que os dados são criptografados e só quem está numa ponta da comunicação tem acesso. Sugiro que ponham a disciplina tecnologia no concurso de magistrados. No passado se dizia que os bons pagam pelos maus. O judiciário ressuscitou o adágio.  É como se a companhia de saneamento  deixasse todo um bairro sem água porque um morador deixou de pagar a conta.

Fonte: Heródoto Barbeiro - Record News / São Paulo/SP



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