O tempo da Quaresma nos convida à conversão; e o papa Francisco nos orienta a trilhar esse caminho de mudança de vida. Uma conversão que nos permite deixar Deus entrar na nossa história. Sim, porque nós temos capacidades, através dos nossos projetos e condutas, de nos opor a Deus, impedir que Ele se torne protagonista de nossas vidas. Celebrando a missa na capela Santa Marta, no Vaticano, Francisco afirmou, citando Isaias (1,17): “Se você aprende a fazer o bem, Deus ‘perdoa generosamente’ todo pecado. O que não perdoa é a hipocrisia, ‘a santidade aparente’”. As palavras do papa têm incomodado por sua franqueza e sinceridade.
Francisco continua sua homilia com criticas aos “santos aparentes” que se preocupam de parecer mais do que ser; e reconhece os “pecadores santificados”, que para além do mal feito aprenderam a "fazer" um bem maior. Assim, o papa não tem dúvida sobre quem Deus prefere na focalização dessas duas categorias, no centro da sua homilia. Nesse sentido, a verdadeira vida cristã se manifesta através do fazer. São os fatos e não as palavras que nos identificam com o nosso Mestre Jesus, o Cristo. Por isso, diz o profeta Isaias (1,17), nas palavras do papa, “Parem de fazer o mal, aprendam a fazer o bem”, que é defender os órfãos e viúvas, isto é, os mais pobres.
Quais são os pobres de hoje? Segundo Francisco, são “aqueles que ninguém recorda, sobretudo os “idosos abandonados, as crianças que não vão à escola e também aqueles que não sabem fazer o sinal da cruz”. Portanto, o imperativo é ativar a conversão para mudar a nossa pobre realidade. A conversão se caracteriza não pelas palavras, mas pela boa ação. Se for assim, o papa se pergunta: “Mas como eu posso me converter? Aprendam a fazer o bem! A sujeira do coração não se remove como você remove uma mancha: vamos à lavanderia e saímos limpos... Remove-se com o ‘fazer’: tomar um caminho diferente, uma estrada diferente daquela do mal.”
O papa continua: “Aprendam a fazer o bem, isto é, o caminho do fazer o bem. E como faço o bem? É simples! Busquem a justiça, socorram o oprimido, façam justiça ao órfão, defendam a causa da viúva. Recordemos que, em Israel, os mais pobres e necessitados eram os órfãos e as viúvas: façam justiça a eles, vão onde estão as chagas da humanidade, onde há tanta dor... E assim, fazendo o bem, você irá lavar o seu coração”. Falando de coração, é evidente que o papa Francisco quer dizer toda a vida da pessoa, na sua plenitude. Desse jeito, a conversão passa pelas ações das nossas vidas e não pelo encanto das palavras.
E a purificação das nossas vidas vem do mesmo Deus, porque Ele gosta de amar assim como somos e não quer ser um fiscal dos
nossos pecados. Por tudo isso, Mário Bergoglio nos lembra o que nos diz o Senhor: “Se você fizer isso, se você vem por este caminho, no qual eu convido você – nos diz o Senhor – ‘ainda que os seus pecados sejam como escarlate, eles se tornarão brancos como a neve’. É um exagero, o Senhor exagera, mas é a verdade! O Senhor nos dá o dom do seu perdão. O Senhor perdoa generosamente. ‘Mas eu perdôo você até aqui, depois vamos ver o resto...’ Não! O Senhor perdoa sempre tudo! Tudo!”
Não adianta se iludir: a verdadeira conversão não é feita de palavras ou discursos, mas de fatos de bem; de coisas boas. Cuidados com as ciladas da vida! Citando o evangelho de Mateus (23,1-12), o papa Francisco mostra o “grupo de astutos, aqueles ‘que dizem as coisas certas, mas fazem o contrário.’” Todos, disse Francisco, somos astutos e sempre encontramos um caminho que não é o certo, para parecer mais justo do que somos: é o caminho da hipocrisia: ‘Esses fingem de se converter, mas o seu coração é uma mentira: eles são mentirosos! É uma mentira. O seu coração não pertence ao Senhor; pertence ao pai de todas as mentiras, Satanás. E esta é a falsa santidade.’
‘Mil vezes Jesus preferiu pecadores a eles. Por quê? Porque os pecadores diziam a verdade sobre si mesmos. "Fique longe de mim, Senhor, que eu sou um pecador! Pedro disse isso, uma vez. Eles nunca disseram isso, mas ‘obrigado Senhor, porque eu não sou um pecador, porque sou justo...’”. Continuando a celebração da nossa Quaresma, precisamos ensaiar com todas as nossas forças a prática da conversão que nos leva a fazer a experiência de quanto Deus nos ama vivendo o seu constante perdão. No entanto, se fizermos da nossa conversão somente uma aparência isto nos levará a praticar a hipocrisia, uma vida iludida e sem esperança.
Fonte: Claudio Pighin, sacerdote, jornalista italiano naturalizado brasileiro, doutor em teologia, mestre em missiologia e comunicação.
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