segunda-feira, 25 de junho de 2018

A JUSTIÇA DIVINA SUPERA A HUMANA

Na revelação transmitida na Bíblia, o Criador cria a criatura. Há, portanto, uma dependência do ser humano perante o Criador. Então, de modo aparentemente paradoxal, a relação mesma com Deus é que permite a liberdade e a responsabilidade que caracteriza o humano. Do contrário, se eu não mantiver essa busca de Deus, eu perco a minha liberdade. Pois, de fato, essa relação do ser humano com Deus é que confere a plenitude ao ser humano, que expressa a sua perfeição original. Sem essa relação, quem somos nós? Seres limitados, tolhidos, presos, vítimas das circunstâncias. Perdemos a dimensão de plenitude que nos caracteriza desde a nossa criação. Assim sendo, compreendemos por que é difícil viver a justiça na sociedade e nas instituições em geral. Mas Deus quer ser protagonista, quer queiramos ou não. Veja o salmo 93 das Sagradas Escrituras que fala justamente desse protagonismo de Deus, Ele não fica no anonimato.

“Senhor, Deus justiceiro, Deus das vinganças, aparecei em vosso esplendor. Levantai-vos, juiz da terra, castigai os soberbos como eles merecem. Até quando, Senhor, triunfarão os ímpios? Até quando se desmandarão em discursos arrogantes, e jactanciosos estarão esses obreiros do mal? Eles esmagam o povo, Senhor, e oprimem vossa herança. Trucidam a viúva e o estrangeiro, tiram a vida aos órfãos. E dizem: O Senhor não vê, o Deus de Jacó não presta atenção nisso! Tratai de compreender, ó gente estulta. Insensatos, quando cobrareis juízo? Pois não ouvirá quem fez o ouvido? O que formou o olho não verá? Aquele que dá lições aos povos não há de punir, ele que ensina ao homem o saber... O Senhor conhece os pensamentos dos homens, e sabe que são vãos. Feliz o homem a quem ensinais, Senhor, e instruís em vossa lei, para lhe dar a paz no dia do infortúnio, enquanto uma cova se abre para o ímpio, porque o Senhor não rejeitará o seu povo, e não há de abandonar a sua herança. Mas o julgamento com justiça se fará, e a seguirão os retos de coração. Quem se erguerá por mim contra os malfeitores? Quem será meu defensor contra os artesãos do mal? Se o Senhor não me socorresse, em breve a minha alma habitaria a região do silêncio. Quando penso: Vacilam-me os pés, sustenta-me, Senhor, a vossa graça. Quando em meu coração se multiplicam as angústias, vossas consolações alegram a minha alma. Acaso poderá aliar-se a vós um tribunal iníquo, que pratica vexames sob a aparência de lei? Atentam contra a alma do justo, e condenam o sangue inocente. Mas o Senhor certamente será o meu refúgio, e meu Deus o rochedo em que me abrigo. Ele fará recair sobre eles suas próprias maldades, ele os fará perecer por sua própria malícia. O Senhor, nosso Deus, os destruirá.”

Evidencia-se nesse salmo uma reflexão sobre o juízo divino contra as injustiças que existem efetivamente no seio do poder, nos órgãos constituídos para reger a vida de um país e, sobretudo, a injustiça contra os menos favorecidos. Esse hino se divide em duas manifestações de queixa e de testemunho de sabedoria. Tudo isso direcionado a Deus para que faça justiça. É Ele a verdadeira justiça. Os versículos de 3 a 7 e 16 a 21 são um grito de queixa pelos triunfos daqueles que praticam o mal e esbanjam da corrupção e opressão dos indefesos e pessoas humildes e desafiam Deus o Senhor do mundo.

Perante tudo isso, os que são explorados repõem toda a confiança na intervenção divina para que faça justiça. Tudo isso revela o grande escândalo da injustiça que impera na sociedade e, ao mesmo tempo, proclama a felicidade das pessoas que confiam no Senhor, o verdadeiro dono de tudo e de todos. A verdadeira justiça vem de Deus, fundamenta-se Nele. E Deus, que enxerga tudo, fará triunfar aqueles que são maltratados e perseguidos e não têm mais ninguém que os defendam. É Deus o defensor dos pobres. Evidentemente aqui se focaliza uma função jurídica de defesa dos injustiçados.
Portanto, o sentido da vingança que aqui se fala não é uma reação cega, mas é a expressão positiva de defesa dos humilhados da justiça oficial dos ‘homens’. Deus não é ausente e está presente também onde se pratica a iniquidade. Por tudo isso, segundo o salmista, o silêncio aparente de Deus que, segundo os ímpios, é considerado como a inexistência de Deus, para os fieis é prova de mais confiança Nele, embora não seja fácil. O papa Francisco, na audiência geral de 26.04.2017, falou:
“O nosso Deus não é um Deus ausente, sequestrado por um céu longínquo; é, pelo contrario, um Deus “apaixonado” pelo homem, tão ternamente amante ao ponto de ser incapaz de se separar dele. Nós somos hábeis em romper ligações e pontes. Ele não. Se o nosso coração arrefece, o seu permanece sempre incandescente. O nosso Deus nos acompanha sempre, mesmo se, porventura, nós nos esquecêssemos d’Ele.”

Fonte: Sacerdote, doutor em teologia, mestrado em missiologia e comunicação.


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