Procura por informações sobre 'como se suicidar' aumentou após a estreias da série '13 Reasons Why"
UM ESTUDO divulgado na semana passada em uma revista de medicina nos Estados Unidos afirma que haver uma relação entre uma série de TV e o aumento do interesse por informações sobre como cometer suicídio.
A equipe do médico e pesquisador John W. Ayers buscou avaliar no Google Trends o impacto causado por "13 Reasons Why", uma série de ficção centrada na descrição detalhada de uma adolescente sobre os motivos que a levaram a se matar.
Em cada um dos 13 episódios, Hannah Baker (Katherine Langford) grava uma fita para as pessoas que ela considera responsáveis pelo seu ato. O desfecho (desculpe o spoiler) é exibido em detalhes no último capítulo.
Baseado no best-seller de Jay Asher, publicado em 2006, "13 Reasons Why" foi muito questionada desde o lançamento. A Netflix teve o cuidado de incluir um aviso na tela, antes de três capítulos mais fortes, alertando que há cenas que o espectador pode considerar perturbadoras e "não adequadas para públicos mais jovens" por conterem "representações de violência e suicídio".
A pesquisa, disponível na mais recente edição da "JAMA Internal Medicine", publicacção da American Medical Association, foi realizada ao longo de apenas 19 dias, entre 31 de março (1917), quando a Netflix colocou a série em seu catálogo, e 18 de abril.
O curto trabalho de campo se explica pelo fato de que em 19 de abril (1917) foi tornado público e suposto suicídio do jogador de futebol americano Aaron Hernandez - e as pesquisas na internet sobre suicídio ganharam outro motivo forte.
No período estudado, a busca em pesquisas com a frase "como se suicidar" aumentou 26%. Por outro lado, pesquisas relacionadas a "prevenção do suicídio" cresceram 23%. E a busca pelo número de telefone de apoio subiu 21%.
Ayres enxerga um "efeito deletério" na série e recomenda que a Netflix remova as cenas que mostrem suicídio ou inclua, em todo episódio, o número de telefone de um equivalente brasileiro do Centro de Valorização da Vida.
Em texto enviado à CNN, a Netflix não demostrou abalo: "Nós sempre acreditamos que esta série aumentaria a discussão em torno deste assunto difícil".
No documentário "13 Reasons Why: Tentando Entender os Porquês", disponível no serviço, o criador do programa, Brian Yorkey, diz: "Nos esforçamos para não ser gratuito, mas queríamos que fosse doloroso assistir porque queríamos deixar muito claro que não há nada, de forma alguma, que valha a pena no suicídio".
A ideia de que o suicídio possa ocorrer por "imitação" é um tema que remonta, pelo menos, ao século 18. Atribui-se ao romance "Os Sofrimentos do Jovem Werther", de Goethe, publicado em 1774, uma onda de suicídios na Europa.
Além de psiquiatras, o assunto também anima debates entre sociólogos desde o fim do século 19, quando Gabriel Tarde (1843-1904) e Émile Durkheim (1855-1917), na França, travaram uma importante polêmica a respeito.
É também um assunto que assombra o jornalismo desde sempre. No estudo "Morreu na Contramão -- O Suicídio como Notícia" (Zahar, 2007), Arthur Dapieve observava: "A imprensa pouco aborda a questão e, quando o faz, quase sempre obscurece o acontecimento individual atrás de uma cortina de eufemismos".
Firme em sua disposição de encarar este tabu de frente, a Netlix já anunciou uma segunda temporada de "13 Reasons Why" para este ano de 2018.
Fonte: Mauricio Stycer - Jornal Folha de São Paulo - Impresso.
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