Duas Rodas acompanhou toda a história da esportiva nacional dos anos 1980; e até testou uma antes da produção começar
O lançamento da Yamaha RD 350 brasileira no final de 1986 marcou o início de um novo momento da marca no país. É preciso voltar um pouco mais no tempo para entender o que acontecia com a Yamaha no Brasil naquela época.
No começo dos anos 1970 as marcas japonesas e algumas europeias eram meras importadoras, ou representadas no país por lojistas. Yamaha e Honda já tinham seus escritórios locais em São Paulo (SP), perto dos principais lojistas. Eram importadas as linhas quase completas, com uma variedade de modelos que começava em 50cc e atingia 750cc.
O cenário mudou quando o governo militar decidiu estimular a produção local de motocicletas, assim como já acontecera com os carros. A importação de motos foi dificultada por taxas elevadas, até cessar completamente em 1976.
Em 1974 a Yamaha inaugurou a primeira fábrica na Grande São Paulo, em Guarulhos (SP), de frente para a Via Dutra. A estratégia foi ficar próxima do mercado consumidor, enquanto a Honda, em 1976, preferiu enfrentar as dificuldades para construir e formar mão de obra na Zona Franca de Manaus (AM).
O esforço para nacionalização progressiva de componentes e desenvolvimento de fornecedores locais limitou o mercado a modelos de baixa cilindrada na segunda metade dos anos 1970. A Yamaha começou com a RD 50, depois as 125 RS, RX e TT.
Para ganhar fôlego contra a concorrência da Honda enquanto não viabilizava a produção local de modelos de maior cilindrada, mais complexos, ampliou a cilindrada da RD para 75 e depois como RX 80, assim como as 125 também chegaram a RX 180.
A década de 1980 já havia começado quando a Honda lançou a CB 400, com motor de 2 cilindros. Passou a ser a moto nacional de maior performance, adaptada com ligeiras modificações sobre um projeto global recente. Em 1982 chegaria outra novidade internacional, a trail Honda XL 250R. E o que a Yamaha tinha de mais recente e inovador na época era a trail DT 180 (toda a linha ainda usava motores de 2 tempos).
A essa altura a Yamaha já estava convencida da necessidade de uma fábrica em Manaus (AM). Ali poderia receber componentes importados com isenção fiscal, que compensaria (muito) os custos adicionais para o transporte das motos até o maior mercado consumidor no Sudeste.
Nos planos iniciais da nova fábrica seriam produzidas a RD 350 LC YPVS e a XT 600Z Ténéré iniciando a linha com motores de 4 tempos. A construção da segunda fábrica já estava avançada em 1984, quando circulava em testes no Brasil uma RD 350 importada do Japão. Essa RD foi cedida para uma avaliação de Duas Rodas com a previsão de lançamento local em 1985.
Aqui vale uma pausa para contarmos a origem do novo modelo no exterior. A RD 350 LC YPVS era uma evolução da RD 350 LC de 1980, que nada tinha a ver com a Viúva Negra dos anos 1970 (exceto o nome).
Era um novo modelo sem carenagens com motor de 2 cilindros que usava refrigeração líquida, não mais a ar, para desenvolver potência superior (55 cv contra 39 cv). E a moto de 1984 que desembarcou no Brasil foi uma evolução, que agregou o sistema de válvulas YPVS para aumentar o torque em baixas rotações.
Consistia em uma borboleta na exaustão de cada cilindro, imediatamente antes dos tubos do coletor de escapamento. Ficavam entreabertas desde a partida e se abriam progressivamente conforme as rotações subiam, até a liberação completa dos gases a 5.000 rpm. Tornou a RD 350 mais fácil de pilotar, principalmente em uso urbano.
Ao redor do motor, a Yamaha aproveitou para atualizar o restante construindo uma nova moto. Chassi, geometria e até a proposta mudaram: passou a ser uma naked esportiva, com semi-guidões mais baixos, de até 59 cv.
Aquela unidade cedida para Duas Rodas foi testada em ruas, estradas e no autódromo de Interlagos. Alcançou 186 km/h e antecipava um novo patamar de desempenho para as motos nacionais. Em junho de 1985, já perto da data de lançamento prevista, a mesma RD foi comparada à Honda CB 450.
A construção da fábrica em Manaus estava atrasada em quase um ano e o lançamento só aconteceria no fim de 1986, já como modelo 1987. Até lá a Honda já teria reagido importando a CBX 750F e encaminhando a nacionalização para 1987. Embora rivalizassem na performance, seriam modelos de concepções e preços muito diferentes.
O modelo nacional da RD 350 1987 já teria as atualizações apresentadas no modelo 1986 do exterior. Incorporava uma carenagem frontal fixa com farol retangular e rabeta redesenhada com lanterna também retangular, seguindo o design da esportiva topo de linha RD 500 LC.
Mais aerodinâmica, beirava os 200 km/h e acelerava a 100 km/h na casa de 5 segundos. O desempenho era muito superior ao da CB 450 e mais próximo da nova Honda 750 de 4 cilindros. Depois de nacionalizada em 1987 a CBX 750F teve o preço reduzido, mas ainda custava o dobro da RD.
Apesar das comparações de desempenho entre RD e CBX, as motos nacionais mais velozes dos anos 1980 tinham conceitos diferentes. A Honda era confortável, grande e pesava 80 kg a mais que a esguia RD com seu motor de 2 cilindros. Um comparativo da época em Interlagos comprovou que a Yamaha levava vantagem nas curvas do miolo e a Honda, nas retas.
No processo de nacionalização a taxa de compressão foi reduzida de 7,2:1 para 5:1, por causa da pior qualidade da gasolina. Os dois carburadores Mikuni 26 tiveram os giclês de alta aumentados para reduzir o risco de quebra do pistão.
As câmaras de combustão foram simplificadas sem o formato hemisférico que permitia ao modelo atingir 59 cv no exterior. No Brasil, o topo da câmara era um cone, de laterais retas, como na trail DT 180, sem o formato arredondado. As modificações reduziram a potência máxima a 55 cv, mas os preparadores locais já conheciam a receita de diminuir os giclês para ganhar potência. Alguns, mais informados, aumentavam a taxa de compressão usando uma junta mais fina, retrabalhavam os orifícios e até recriavam a câmara hemisférica artesanalmente, também desgastando o metal.
Por outro lado, a suspensão dianteira mantinha a regulagem pneumática e os pneus não usavam câmara pela primeira vez no país. Dois itens que foram suprimidos da CBX nacional.
Pouco mudaria na Yamaha RD 350 até o fim da produção, em 1993. As principais atualizações ocorreram na carenagem, que recebeu adição de peças laterais para cobrir o motor de forma integral a partir de 1988. Para 1991 a mudança foi maior, com novo formato e dois faróis redondos no lugar do retangular. A produção local terminou em 1993, quando motos importadas (mais modernas) já estavam de volta ao país.
Fonte: Revista Duas Rodas.
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