Nicho de hipóteses mirabolantes e causos misteriosos movimenta mercado
de influenciadores no app, popular entre crianças e adolescentes. Empresa
lançou medidas para tentar frear disseminação de informações falsas.
Qual a imagem de alguém que espalha teorias da conspiração pela internet?
Pode ser aquele tio que encaminha bobagens no grupo da família no “zap”. Mas também pode ser o sobrinho que passa o dia gravando dancinhas para postar no TikTok.
Muito além das coreografias divertidas,
o aplicativo de vídeos curtos, popular entre crianças e adolescentes, tem
disseminado hipóteses mirabolantes e causos misteriosos, que por lá recebem a
roupagem “teen” de seus usuários.
Por exemplo: dizem por aí que
bilionários e celebridades de Hollywood estão usando uma substância secreta,
extraída de crianças sequestradas e submetidas a rituais de tortura, para
parecerem jovens por mais tempo. É uma das conspirações mais populares do
TikTok e, é claro, não há provas (nem ao menos indícios) de que seja real.
“As teorias dão uma certa adrenalina,
que muita gente gosta de sentir. Existem coisas no mundo que são inexplicáveis,
e esses mistérios estimulam as pessoas”, sugere Julia Cassini, um dos principais
nomes desse nicho no TikTok: tem mais de 3,5 milhões de seguidores.
Ela faz parte do grupo de jovens
influenciadores que hoje fecham parcerias publicitárias com marcas e ganham
dinheiro, graças ao engajamento gerado por teorias das conspiração.
Com 6 milhões de seguidores, Ana
Woycick é tão famosa nesse segmento que há até uma conspiração na qual ela é a
protagonista. Há quem diga que a garota é uma mensageira enviada ao Brasil para
ajudar as pessoas a compreenderem um “grande plano”, que está prestes a ser
colocado em prática -- insira aqui um emoji pensativo.
Google e YouTube são meus melhores amigos. Passo umas 12 horas por dia pesquisando teorias.”
São boatos dos mais variados tipos, que circulam na internet: a teoria de que o mundo acabou em 2012 e estamos vivendo num universo paralelo, de que músicas da Galinha Pintadinha têm mensagens subliminares, de que J. K. Rowling não escreveu os livros “Harry Potter”, de que uma marca de maionese tem pacto com o inferno…
Algumas pessoas acreditam, principalmente crianças que usam o app, conta Ana. “Algumas ficam alucinadas, mandam comentários dizendo que ficaram com medo. Quando isso acontece, respondo explicando que é só uma teoria.”
Do 5G aos Illuminati
Elucubrações
como essas sempre despertaram interesse e renderam material vasto para filmes,
séries e livros.
O problema é que, numa rede social, sem
a máscara da ficção, histórias assim podem ser espalhadas como se fossem
verdades absolutas, uma possibilidade que tem preocupado os aplicativos no
contexto da pandemia.
Mais uma fantasia famosa no TikTok cita
o enredo do filme “Eu sou a lenda” (2007) pra sugerir que a vacinação contra a
Covid pode transformar humanos em mutantes zumbis.
Outras teorias malucas envolvendo o
coronavírus incluem as teses de que ele foi criado propositalmente em
laboratório, como arma biológica, de que está relacionado com
antenas de internet 5G ou é uma invenção dos Illuminati, na
tentativa de estabelecer uma nova ordem mundial. Tudo falso.
Em redes como Facebook e Twitter, um usuário é exposto principalmente a publicações de quem ele escolheu seguir. O TikTok tem um mecanismo diferente: sua principal aba, a página “Para você”, pode exibir qualquer vídeo que o algoritmo considere interessante para quem assiste.
Isso significa que, se alguém vê um vídeo de conspiração, o aplicativo lhe oferecerá mais e mais, ampliando o repertório de teorias daquele espectador. Para compartilhar esse conteúdo em outras plataformas (o WhatsApp, por exemplo), bastam dois cliques.
Além disso, outras redes sociais lidam
há anos com fake news e, ao longo do tempo, aprimoraram mecanismos para tentar
frear a disseminação desse tipo de conteúdo -- que, apesar de todos os
esforços, continua circulando.
Já, no TikTok, o fenômeno é relativamente
novo. O aplicativo ganhou popularidade mundial em 2018 e, no Brasil, se
fortaleceu principalmente após o início da pandemia.
Para tentar
identificar e remover informações enganosas e potencialmente nocivas, a empresa
fechou parcerias com agências de checagem.
O TikTok diz que, no segundo
semestre de 2020, foram removidos do app quase 90 milhões de vídeos, que
desrespeitaram os termos do serviço. Desses, 2,4% (mais de 2 milhões) violaram
a política de integridade e autenticidade, que inclui conteúdos de desinformação.
A porcentagem é o dobro da registrada
no semestre anterior.
Para informações duvidosas, mas que não
puderam ser checadas, a plataforma lançou em fevereiro uma etiqueta que avisa
os usuários sobre conteúdos potencialmente enganosos.
A empresa não informa quantas
publicações já receberam o selo, mas diz que, no período de testes do recurso
com um número limitado de usuários, o compartilhamentos desses vídeos diminuiu
24%.
Ainda assim, conteúdos desse tipo
continuam dominando a aba "Para você" de alguns usuários. Vídeos
marcados com a hashtag #teorias (em português) já foram vistos mais de 1 bilhão
de vezes no aplicativo.
Julia, uma das
influenciadoras das conspirações, acredita que é possível produzir esse tipo de
conteúdo sem espalhar informação perigosa.
"Tem muitas histórias que circulam
há tanto tempo que as pessoas começam a considerar que são verdadeiras. Por
isso, é preciso deixar bem claro o que é uma história, o que é uma teoria e o
que é um conto de terror inventado, por exemplo", defende.
"E, quando o assunto chega em algo
mais polêmico, como questões de saúde, prefiro nem postar. Não tenho nenhuma
propriedade pra falar sobre isso."
Fonte: G1.
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