Suspeita-se que os deputados não vão mais poder se reunir. O clima político chega perto de uma explosão e há quem despeje mais combustível na fogueira. Os jornalistas e jornais formam uma verdadeira coligação e atacam impiedosamente o chefe do Poder Executivo. Há um consórcio que divulga apenas as más notícias, que afetam o governo como um todo. E por tabela o Brasil. Diante do clima de confronto político, as moedas estrangeiras sobem de preço em relação à moeda nacional e os produtos importados ficam ainda mais caros. É verdade que a elite dominante tem o suficiente para viver nababescamente e não se importa com a população mais pobre, espremida nas favelas das cidades litorâneas ou espalhada pela imensidão do interior do país, onde é espoliada pela oligarquia dos grandes proprietários de terras. Sobra muito pouco para quem não tem terra ou um cargo público conseguido graças ao troca-troca de interesses entre a burocracia estatal e os detentores do capital. É uma herança que vem do passado distante e se cristalizou ao longo do tempo. Poucos acreditam que uma reforma constitucional possa modernizar o Brasil.
Os liberais lutam para conseguir aprovar uma Constituição que limite os poderes do Poder Executivo. Lutam para que o Legislativo seja o mais importante poder nacional, uma vez que os deputados são eleitos nas várias regiões do país e, pelo menos teoricamente, representam o povo da sua região. Não é bem assim, uma vez que a maioria da população não tem educação política e mal sabe para que serve um representante no parlamento. Os debates em plenário são pautados pelas matérias publicadas pelos jornais, que por sua vez se retroalimentam da troca de acusações entre os políticos. Há o temor de que a qualquer momento a força militar seja acionada e a Câmara fechada. Contudo, a ala radical da oposição não dá tréguas, desafia o chefe do Executivo e defende que ele tem tendências absolutistas graças ao apoio que tem, principalmente, do Exército. Ninguém sabe o que vai acontecer. Há um temor de confronto entre os soldados e a oposição espalhada pelas ruas da capital do país.
O confronto chega ao auge quando da divulgação da decisão da Câmara dos Deputados. Redigem um documento que limita o poder do soberano, submetem o orçamento nacional e desenham um sistema que privilegia apenas os mais ricos. O critério para ser um deputado ou senador é sua renda pessoal. Para votar os homens – mulheres são excluídas – necessitam ter uma renda razoável. Imediatamente os jornalistas apelidam o texto de Constituição da Mandioca. A liderança política está sob a batuta dos irmãos Andradas. Um deles, José Bonifácio, até bem pouco tempo era o chefe do governo do regente, e depois imperador Dom Pedro I. Este manda um recado que só aceitaria o texto da primeira Constituição se fosse digna do Brasil e dele. Em outras palavras, não aceita o anteprojeto redigido na Câmara. O ápice da crise é o recado que os Andradas mandam para Dom Pedro I que vão continuar em frente e promulgar a primeira Constituição do Brasil. As tropas fiéis ao imperador cercam o prédio no Rio de Janeiro onde se reúne a Assembleia Constituinte. O comandante tenta negociar a saída pacífica, sem êxito. À noite deputados iluminam o plenário com velas. O trabalho continua, porém com poucos parlamentares. A maioria deixa o prédio sorrateiramente temendo a ação dos soldados ou as vaias do povo diante do ato de covardia. Prossegue a Noite da Agonia. Na madrugada, os soldados entram, não encontram reação e prendem os recalcitrantes. Os irmãos Andradas, considerados os mais perigosos, são enviados ao exílio. O conselho de Estado se reúne, mexe no texto e insere o poder moderador. O imperador acumula dois poderes. O que era para ser promulgado, é outorgado. Contudo, nem assim o clima de animosidade se desfaz e o período do primeiro reinado é pontilhado de novas crises.
Fonte: Jornalista Heródoto Barbeiro / Record News-SP.
Nenhum comentário:
Postar um comentário