Parecia uma miragem: no país que é o maior produtor mundial de carnes e de proteínas animais havia em cada cidade uma enorme fila para se pegar osso. Nessas filas, que dobravam quarteirões e estranhamente se formavam diariamente, havia todo tipo de gente à espera do seu “santo ossinho de cada dia”: vereadores, prefeitos, governadores, deputados, senadores, ministros, juízes, desembargadores, artistas, padres, pastores, médicos, jornalistas, funcionários públicos. Os donos desses açougues, que agora estão morando nos cortiços, periferias e também nas favelas, mandavam abrir seus estabelecimentos logo cedo para que pudessem atender bem a todos. Petistas e esquerdistas não iam a essa fila, pois recebiam religiosamente em suas casas fatias inteiras de filé mignon, picanha, alcatra, dentre outras suculentas peças de carne bovina.
O presidente do país, padre Júlio Lancellotti, homem de patrimônios inestimáveis, dentre eles incontáveis indústrias, muitas fazendas, inúmeros iates de luxo, infinitos frigoríficos além de várias ‘offshores’ em paraísos fiscais, não gostava muito dessas filas “inconvenientes”. Ele dizia sempre em seus costumeiros discursos de ódio que se “essa mania de se alimentar com ossos bovinos continuar, seu governo pode ter a imagem manchada no exterior”. E ele tinha certa razão, pois não é possível que muitos governadores com suas esposas tenham que ir quase todo dia para a fila muito antes de ir aos palácios dar expediente. Muitos se perguntavam: por que juízes e desembargadores, antes de irem às varas e aos tribunais, têm que passar ali? Militares de altas patentes também são vistos naquelas filas para poder pegar o seu quinhão de osso.
A poderosa elite deste país sempre foi muito injustiçada mesmo. “Sofre igual a sovaco de aleijado”. Em todo governo ela passa por “poucas e boas”. E o pior: entra governo e sai governo e ninguém se lembra desta classe social. O que custava, por exemplo, para essas autoridades criarem uma espécie de ajuda ou até uma “bolsa-osso” para toda essa sofrida gente rica? Por que eles têm que ir a estas filas intermináveis à procura de algo para se alimentar? Os nossos ricos e endinheirados não têm nem nunca tiveram bons planos de saúde, não têm boas escolas e sempre estão à espera dos restos dos pobres e miseráveis. Não fossem alguns pobretões do Brasil, os ricaços estavam à míngua, passando fome. E neste país, pobre tem pena de rico. Daqui a pouco quase mais ninguém da alta sociedade vai poder ir a Paris ou mesmo à Disney durante suas férias.
É só observar como é injusta a estrutura da nossa sociedade. Os médicos são quase todos oriundos das classes mais pobres e “inferiores”. Talvez por isso geralmente eles cobram horrores por uma simples consulta. Juízes, desembargadores, ministros do STF, advogados, ministros de Estado e até os políticos de um modo geral praticamente vieram das favelas e das incontáveis comunidades espalhadas por este país afora. Outro dia, numa sentença inédita, o STJ revogou a prisão de uma perigosa meliante paulistana, moradora de rua, que havia surrupiado de um supermercado algumas mercadorias no valor de 21,69 reais para alimentar seus cinco filhos. Antes, a PM e alguns juízes de São Paulo, mostrando que a nossa Justiça é um primor, prenderam e condenaram a ladra, que passou alguns dias no xilindró. É bem possível que se pertencesse à elite, ela jamais teria saído da prisão. Aqui, “o osso é agro, é tech, é tudo”. Vamos à fila do osso, mano?
Fonte: Professor Nazareno / Porto Velho-RO.
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