O presidente brasileiro é recebido pelo presidente dos Estados Unidos na Casa Branca. Uma demonstração de apreço ainda que quase todos os chefes de estado que vão a Washington passem por lá. Tem sempre aquela foto tradicional em que estão sentados ao lado de uma lareira e trocam sorrisos para os jornalistas. Nos bastidores, o clima não é tão descontraído. O presidente norte-americano, apesar de pertencer ao Partido Democrata, não vê com bons olhos a onda vermelha que cobre boa parte do continente latino-americano. Além de Cuba, eterna rival, outros países avançaram para a esquerda, uns por meio de eleições democráticas; outros, via ditaduras. O fato é que as relações entre latinos e norte-americanos não é pacífica. Empresas americanas são nacionalizadas, não indenizadas e acusadas de exaurir as riquezas nacionais para os potentados acionistas de Wall Street. De outro lado, há sempre o temor de ascensão de governos hostis ao Tio Sam.
Republicanos e democratas são as duas faces da mesma moeda, do mesmo sistema, avaliam alguns intelectuais latinos. Podem divergir de um programa de governo ora protecionista, ora liberal, de acordo com os interesses americanos. Republicanos são mais nacionalistas, mas democratas também o são. Juntos não abrem mão da hegemonia yankee, solidificada depois da guerra. Já os partidos de esquerda da América Latina rotulam os Estados Unidos de imperialistas e divulgam slogans como Yankee, Go Home! O Departamento de Estado tem uma subseção para acompanhar o que se passa abaixo do Rio Grande. Está de olho especialmente na forma de administração da economia, se há ou não déficit, se gastam mais do que arrecadam, se ameaçam as grandes propriedades do agronegócio com uma reforma agrária sem indenização aos proprietários. Nem mesmo a ajuda norte-americana para programas sociais consegue melhorar a imagem do Tio Sam, sempre retratado pela esquerda como sanguessuga das riquezas dos trabalhadores.
O Brasil depende do mercado norte-americano. E do financiamento para obras públicas. E para pagar as parcelas da dívida externa com os grandes bancos internacionais. Em suma, o presidente vai à Casa Branca com o pires na mão. O democrata John Kennedy recebe João Goulart com deferência. Ele é recebido também no Congresso. Contudo, o que mais quer é uma linha de crédito para seu governo. A resposta é que o Brasil deve seguir as recomendações do Fundo Monetário Internacional antes de obter novos financiamentos. Em outras palavras, o país está inadimplente e ninguém empresta dinheiro para quem não pode pagar. A direita americana rotula Goulart como um político que tem o apoio da esquerda brasileira, refratário a acordos militares com os Estados Unidos e não favorável à intervenção americana em nenhum país latino-americano. Nem em Cuba. As tensões nucleares entre União Soviética e Estados Unidos, em abril de 1962, galopam em direção a um confronto bélico. João Goulart volta ao Brasil com as mãos vazias, apenas com a promessa de um pequeno empréstimo. Assiste, alguns meses depois, do Palácio do Catete, à crise dos foguetes de Cuba, que por pouco não levou o mundo a uma terceira, e talvez, última guerra mundial.
Fonte: Jornalista Heródoto Barbeiro / Record News-SP.
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