O Brasil não precisa de mais uma polêmica. A situação econômica não é confortável, as exportações estão em queda e a moeda estrangeira está sobrevalorizada. Com isso, os produtos importados ficam mais caros e ninguém mais acredita nos números da inflação divulgados. O chefe do Poder Executivo é acusado de ser um extremista, favorável a um regime tirânico apoiado nas elites que dominam o país há muito tempo. Não faltam críticas, manchetes, editoriais, charges nos jornais que o atacam incansavelmente. Perde-se na disputa política o papel que ele desempenhou para derrubar do poder os autoritários que infelicitam a nação, aparelharam o Estado, vivem da propina das obras públicas e usam e abusam do patriarcalismo. Ninguém sabe o que vai dar a crise constante que vive o Brasil, nem se a oposição vai conseguir derrubar o chefe do Poder Executivo. Há clima de revolta e golpe no ar. As acusações são mútuas entre os governistas e os oposicionistas. Mais uma vez, o debate não é acompanhado pela população aparvalhada e não convidada para esta festa pobre.
Consta do projeto de Constituição, elaborado pela Assembleia Constituinte, a divisão dos poderes de inspiração liberal e consolidada na Constituição dos Estados Unidos da América. A proposta liberal cogita de Executivo, Legislativo e Judiciário, independentes, autônomos e solidários. Não há menção para um quarto poder, o Moderador. O texto não contempla a proposta do político Benjamin Constant, defensor de um quarto poder. Não existe nem na América, modelo presidencialista, nem no Reino Unido, modelo parlamentarista. Uma modificação como essa só é possível se for submetida a um plebiscito popular. Não se concebe que um grupo de juristas se arrogue o direito de introduzir a novidade sem consultar o povo. Afinal, esses homens, por mais que sejam forjados no poder, não têm mandato para tanto. Por isso o debate se torna cada vez mais intenso quando se fala de um quarto poder no Brasil. “Mais uma jabuticaba brasileira”, dirão os críticos de sempre, só que desta vez o pé da planta foi importado da Europa. Lá, há seminários, cursos com a participação de juristas brasileiros que defendem o Poder Moderador abertamente e suas opiniões são divulgadas no Brasil. Mais choque desnecessário entre os poderes.
Afinal, quem pode exercer esse poder moderado, também chamado de neutro, responsável pelo equilíbrio de forças entre o Executivo, Legislativo e Judiciário? A quem vai se entregar tanto poder? Os constituintes não o preveem no texto original. Contudo, o conflito dos deputados com o chefe do Poder Executivo mistura a luta pelo poder com até mesmo questões relacionadas com o nacionalismo. Autocrata, autoritário, ditador, absolutista, é o que se lê todos os dias na mídia. A crise estoura com a chegada de tropas militares na porta do prédio onde funciona a Assembleia Constituinte. Dom Pedro I recusa-se a negociar com a oposição, que tem na liderança o ex-ministro José Bonifácio e seus irmãos. O prédio é cercado, e os parlamentares juram morrer na ponta das baionetas pela defesa da democracia. Começa em 1823 a Noite da Agonia. Pela madrugada, sem mais debates, os deputados deixam o prédio pacificamente, passam pelos soldados e seus canhões e vão dormir tranquilamente em suas casas. Mas o imperador e seus acólitos não dormem. Prendem políticos e exilam os irmãos Andrada na Europa. Convoca um grupo de juristas que redigem um novo texto e asseguram ao imperador dois poderes: o Executivo e o Moderador. Este sobreviveu até o fim do Império. Depois do advento da República nunca mais se ouviu dizer que algum órgão do Executivo ou Judiciário exerce o Poder Moderador. Nem o atual Supremo Tribunal Federal. Será?
Fonte: Jornalista Heródoto Barbeiro / Record News-SP.
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