quarta-feira, 19 de julho de 2023

Medo de Tecnologia?


Como vamos administrar socialmente essa enorme substituição de pessoas pelas máquinas? Há quem responda que já tivemos várias outras revoluções e nos reorganizamos, mas a que custo e quem efetivamente conseguiu se reorganizar? A pobreza e a fome ainda estão entre nós.

Confesso que tenho estado com um pouco de medo dos avanços tecnológicos que temos feito. As ficções talvez reforcem essa sensação, por exemplo, a série “Black Mirror”. O que assustava ali não eram monstros ou a tecnologia em forma de robôs assassinos, era a proximidade das histórias – levadas ao limite – com a realidade. Em um episódio uma mulher desesperada fugia de uma perseguição e as pessoas em volta se preocupavam em filmar com seus celulares.

Já temos visto isso em acidentes e espetáculos nos quais filmar o momento é mais importante do que viver o momento ou efetivamente prestar um socorro a alguém. Em outro episódio, uma moça se desdobra para receber “likes” porque a quantidade de “likes” que cada pessoa possuía determinava possibilidades importantes para suas vidas.

O número de seguidores já é hoje um parâmetro importantíssimo, inclusive da possibilidade de ganhos financeiros. E há o episódio no qual uma jovem perde seu marido em um acidente, compra um aplicativo que, a partir das informações oriundas das redes sociais do marido morto, simula conversas e permite que a viúva continue falando com ele através desse recurso.

Hoje é possível reproduzir a conversa de qualquer pessoa através das informações sobre ela disponíveis na internet, e se uma parte significativa de nossas conversas habituais é remota, o que significará “morrer” no futuro? Em um filme antigo filme de Arnold Shwarzenegger não era preciso viajar, bastava comprar as memórias da viagem, que ao fim e ao cabo é realmente tudo que nos resta das viagens, quando voltamos. No filme “Ela”, o personagem se apaixona por um sistema operacional.

Cada vez mais temos ouvido as coisas que a chamada “Inteligência artificial” – que para alguns não é inteligência e nem é artificial – é capaz de fazer e já faz, dentre elas, por exemplo, escrever textos, fazer apresentações ou colocar a voz de Freddie Mercury cantando uma música dos Beatles que ele jamais cantou e jamais cantará – pelo menos não nessa nossa dimensão. O autoatendimento já e uma realidade, mas como vamos administrar socialmente, mas como vamos administrar socialmente essa enorme substituição de pessoas pelas máquinas? Há quem responda que já tivemos várias outras revoluções e nos reorganizamos, mas a que custo e quem efetivamente conseguiu se reorganizar? A pobreza e a fome ainda estão entre nós.

O passado, o futuro, as experiências, as relações, as preocupações, os afetos, a educação, os empregos, a morte, podemos e queremos mexer em tudo isso mesmo, sem freios e sem pensar nas consequências? Indagar os rumos da tecnologia é somente uma pergunta de quem tem dificuldade de compreender o novo e não indaga-la é somente irresponsabilidade que causará problemas para nós mesmos?

Gosto de lembrar que nossas bisavós muitas vezes olhavam para nossas avós e avôs e achavam que o mundo e a juventude estavam perdidos. Talvez as mudanças que estamos fazendo sejam dignas de medo mesmo.


Fonte: Monica Abrantes Galindo – É vice-diretora eleita da Unesp de Rio Preto, professora, conselheira do Conselho Afro Municipal, participante dos coletivos Mulheres na  Política e CDINN- Coletivo de Intelectuais Negras e Negros. Jornal Diário da Região.



(SJRP)


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