quinta-feira, 1 de outubro de 2020

Salles aprova fim de regras que protegiam manguezais

Decisões do Conama abrem espaço, por exemplo, para especulação imobiliária nas faixas de vegetação das praias



Com um conselho de meio ambiente controlado majoritariamente por ministérios e membros do governo federal, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, aprovou ontem a extinção de duas resoluções que delimitavam as áreas de proteção permanente (Apps) de manguezais e de restingas do litoral brasileiro. A revogação dessas regras abre espaço para especulação imobiliária nas faixas de vegetação das praias e ocupação de áreas de mangues para produção de camarão.

O Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), presidido por Salles, revogou ainda uma resolução que exigia o licenciamento ambiental para os projetos de irrigação, além de aprovar uma nova regra, para permitir que materiais de embalagens e restos de agrotóxicos possam ser queimados em fornos industriais usados na fabricação de cimento, substituindo as regras que determinavam o devido descarte ambiental desse material.

Ambientalistas, parlamentares e a Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente (Abrampa) pediram, sem sucesso, que todos os itens fossem retirados da pauta da reunião do Conama, instituição que tem caráter consultivo e deliberativo sobre questões ambientais.

A revogação das resoluções 302 e 303, ambas de 2002, elimina instrumentos de proteção dos mangues e das restingas, as faixas com vegetação comumente encontradas sobre áreas de dunas, em praias do Nordeste. O argumento do governo é que essas resoluções foram abarcadas por leis que vieram depois, como o Código Florestal.


Irrigação

Especialistas em meio ambiente apontam, porém, que até hoje essas resoluções são aplicadas, por que são os únicos instrumentos legais que protegem, efetivamente essas áreas. No mês passado, por exemplo, em São Paulo, a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) perdeu uma ação na Justiça e foi obrigada, por meio de sentença, a respeitar as delimitações previstas na resolução de 2002, "para evitar a ocorrência de dano irreparável à coletividade e ao meio ambiente".

Já revogação da resolução 284, de 2001, acaba com os critérios de regras federais para licenciamento ambiental de empreendimento de irrigação. No entendimento dos ambientalistas, a revogação tem o objetivo de acabar com exigências legais a pedido de parte do agronegócio.

Órgão foi desidratado por ministro

A decisão do Conama expõe, claramente, a forma como o governo passou a controlar um órgão que, por missão histórico, sempre teve composição técnica e independente. Desde julho do ano passado, o Conama, que define normas e regras ambientais, foi completamente desidratado em relação à sua estrutura anterior, por determinação de Ricardo Salles.

O ministro concentrou nas mãos do governo federal e de representantes do setor produtivo a maioria dos votos. Estados e entidades civis perderam representação. O Conama teve seus membros reduzidos de 96 para 23 representantes. Carlos Bocahy, presidente do Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (Proam), afirma que, pela estrutura atual, o governo federal passou a ter 43% de poder de voto dentro da composição do conselho, além de outros 8% de poder de voto do setor empresarial.

Os demais votos estão diluídos entre membros dos estados, municípios e sociedade civil. Se antes estes somavam 60% de poder de voto, passaram a ter 49% na nova composição.


SAIBA MAIS

As decisões anunciadas ontem pelo Conama passaram a ser alvos de uma série de questionamentos judiciais assim que foram oficializadas, no início da tarde. A Rede Sustentabilidade entrou com ação no Supremo Tribunal Federal (STF), com pedido para que seja declarada a inconstitucionalidade da extinção das resoluções. Na Câmara, o deputado Alessandro Molon (PSB-RJ) apresentou um projeto de lei no qual também pede que a medida seja sustada, para que os temas sejam analisados. A Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente (Abrampa) também emitiu uma manifestação de repúdio contra a proposta de extinguir as resoluções ambientais.

Fonte: EM PAUTA - Jornal A Gazeta de Rondônia.









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