sábado, 5 de setembro de 2020

MOMENTO JURÍDICO - Saiba o que é Tráfico Privilegiado

Para quem nunca ouvi falar do que se trata, parece ser muito estranha essa expressão; tráfico privilegiado? Existe privilégio para quem trafica drogas? Sim, existe, mas não da forma que você está pensando, trata-se da aplicação da pena, no caso de condenação observados alguns requisitos.
Mas cuidado, não é privilégio por traficar, mas se algumas condições estiverem presentes naqueles que são CONDENADOS por tráfico de drogas, podem receber um privilégio de diminuição de pena.
Então, tráfico privilegiado é uma diminuição da pena para aqueles que são condenados por tráfico de drogas. E é sobre isso que esse artigo vai tratar.
1 – CONCEITO
De início para entender a questão do tráfico privilegiado é importante sabermos qual é a pena do tráfico de drogas.
Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:
Pena – reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.
Percebemos então que a pena do tráfico é de 5 a 15 anos. O mínimo é cinco e o máximo é 15 anos.
Entretanto, há uma possibilidade de diminuir essa pena de forma considerável, que é a aplicação do privilégio. Vejamos o texto de Lei;
4º Nos delitos definidos no caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos , desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa. Art. 33.
Imagine que alguém foi condenado a 6 anos de reclusão por tráfico de drogas apenas, e possui alguma das características do parágrafo 4º acima, e o juiz aplica a redução máxima de dois terços, terá a pena reduzida para 4 anos, numa simples conta de padaria, (6.2)/3= 12/3=4.
É uma diminuição de dois anos na pena total, isso é o privilégio que é aplicado à condenação do tráfico de drogas.
2 – REQUISITOS PARA APLICAÇÃO DO PRIVILÉGIO
Previstos no parágrafo 4 do artigo 33, estão os requisitos que autorizam a aplicação do privilégio, vejamos um por um.
A) Primariedade. O primário é aquele que na data da condenação não possui nenhuma outra condenação transitada em julgado. Não importa se possui outros processos, o que não pode é ter outras condenações. O reincidente não é necessariamente condenado no mesmo crime, mas em qualquer crime, é aquele que não tem a CAC, (certidão de antecedentes criminais) suja. Inclusive, o STJ tem a Súmula n.º 444, estabelecendo que “É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base”.
B) Bons antecedentes. É o não registro de qualquer condenação criminal. Mas vai além, pois senão, todo primário seria de bons antecedentes. Os bons antecedentes decorrem da vida familiar, profissional, pessoal do réu. Em nossa opinião é tudo aquilo que a pessoa “FAZ” que se valora positivamente, como exemplo temos uma pessoa que é voluntária em serviços de caridade.
C) Não se dedique as atividades criminosas. Essa questão deverá ser observada se a pessoa responde a processos criminais. Sim, imagine alguém que responde a 2 processos por furto, 2 por tráfico e agora está sendo condenada em um deles, mesmo que não transitada em julgado nenhuma das decisões, ser observará os processos para entender que essa pessoa é dada à vida do crime.
D) Não integre organização criminosa. É aquele que faz parte de quadrilhas, exemplo PCC, CV. Essa informação é obtida até mesmo dos próprios réus que informam nos depoimentos fazer ou não parte de determinadas facções. O STJ entendeu, num caso concreto, que a quantidade de drogas que o agente portava era muito grande, e que daí se poderia concluir que ele se dedicava a atividades criminosas, e por isso estaria afastado o benefício do tráfico privilegiado (HC 271.897/SP e HC 220.848/SP).
Importa ainda nesse tópico dizer que os requisitos são cumulativos pelo entendimento da maioria da doutrina, e pela lógica, pois dificilmente alguém que tem antecedentes criminais teria bons antecedentes, e se for membro de organização criminosa da mesma forma.
3 – O TRÁFICO PRIVILEGIADO NÃO É EQUIPARADO A CRIMES HEDIONDOS  
Em 2016 o STF afastou esse entendimento, e por isso o tráfico privilegiado não deve ser mais considerado como crime equiparado a hediondo, tendo sido inclusive cancelada a Súmula 512 do STJ.
Por não ser hediondo, caberia inclusive a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, senão for esse o entendimento que o regime inicial a depender da pena, seja o semiaberto.
O Tribunal de Justiça de São Paulo reconheceu o tráfico privilegiado e substituiu a pena privativa de liberdade de um réu por restritiva de direitos.
Assim, seguindo o voto da desembargadora, a 12ª Câmara de Direito Criminal do TJ-SP afastou da condenação o crime por associação para o tráfico. Com isso, permitiu a um dos réus o reconhecimento do tráfico privilegiado, uma vez que é réu primário.
Com isso, concluiu ser possível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, e alterou o regime prisional para inicial aberto. De acordo com a decisão, o réu terá que prestar serviços comunitários pelo tempo que resta da pena. Processo 0000245-03.2017.8.26.0588.
4 – A “MULA” E O TRÁFICO PRIVILEGIADO
O STF também tem aplicado o tráfico privilegiado à “mula”, que, no caso, era uma pessoa que engoliu cápsulas de cocaína para transportá-las. Posteriormente o STF também entendeu que a atuação da pessoa como “mula” não significa necessariamente que ela faça parte de organização criminosa, mas que tenha sido esporadicamente cooptada para realizar o transporte de drogas.
Finalizando, entendemos que o Tráfico privilegiado é uma causa de diminuição de pena, e que não pode ser equiparado à crime hediondo, em caso de reconhecimento na sentença de tráfico privilegiado haverá uma considerável diminuição na pena, bem como a possibilidade de substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, o que é um grande benefício para o réu.
Fonte: Rafael Rocha, Advogado
Advogado Criminalista
O advogado Rafael Rocha é advogado criminalista, consultor e parecerista em matéria Penal e Processo Penal. Formações Acadêmicas. • Bacharel em Direito pelo INESC/MG • Bacharel em Teologia pelo SETECEB/GO • Pós graduado em Direito Empresarial pela FIJ/RJ • Pós graduado em Direito Penal e Processo Penal pelo ATAME/GO Entidades das quais faço parte. • Vice Presidente da Comissão de Direito Penal Militar OAB/GO 2016-2018 • Membro do Grupo Brasileiro da Associação Internacional de Direito Penal. • Membro da OAB/GO • Abracrim – Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas www.rochadvogados.com.br - Jus Brasil

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