sábado, 30 de dezembro de 2023

A CARNE SE FEZ VERBO / A inteligência artificial não pode se comparar à criatividade humana



Foi Galileu quem disse primeiro, no final do século 16, que todos os corpos caem na Terra com a mesma velocidade, ainda que tenham prsos diferentes. Teria constatado isso ao jogar objetos pesados e leves, ao mesmo tempo, do alto da torre de Pisa.

A história mostra a primazia da pesquisa empírica sobre as especulações meta-físicas e, em decorrência, a superioridade do método científico sobre dogmas religiosos? Não. Mas a descoberta de Galileu serve de exemplo para algo de fato decisivo: a criatividade humana.

"Ele não soltou bolas das alturas da torre de Pisa", diz Noam Chomsky em "Os Segredos das Palavras", um livro com seu longo diálogo com o linguista italiano Andrea Moro, publicado pela editora Unesp. O que Galileu fez foram "experimentos mentais muito inteligentes".

Ele notou que, se um objeto pesado caísse mais rápido que um leve, se eles estivessem amarrados um ao outro haveria uma contradição: o mais leve retardaria o mais pesado, mas juntos cairiam mais depressa, já que o peso total dos dois seria maior do que o do mais pesado sozinho.

Galileu então generalizou: toda as coisas caem na mesma velocidade, se desconsiderarmos o atrito com o ar, que depende de suas formas - como um objeto de dez quilos de algodão tem uma superfície maior que um de dez quilos de chumbo, o primeiro cairá mais devagar. 

É com argumentos como esse, tirados da história da ciência, que Chomsky critica o "entusiamsmo e a empolgação com a inteligência artificial", o "exagero e a propaganda sobre o quanto as conquistas são incríveis".

Ele compara  a excitação atualm com o fetiche da tecnologia surgido no pós-Guerra nas universidades ianques. A Europa estava devastada, enquanto nos Estados Unidos a guerra propiciava os avanços tecnológicos que fizeram a produção industrial quadruplicar.

Hoje em dia, diz Chmsky, os computadores "falam", mas não esclarecem como nasce e opera o insttumento vital ao pensamento: a línguagem. O que a inteligência artificial faz é simulá-la, enchendo-a com informações que abarrotam bancos de dados.

Na sua teoria, a gramática gerativa, Chomsky, a gramática gerativa, Chomsky diz que a linguagem é inata aos humanos. Assim como com a deglutição já no nascimento, com cerca de dois anos os bebês entendem e usam a linguagem. 

Esse atendimento é inerente 1à anatomia humana. Afora isso, a ciênmcia pouco avançou na compreensão da línguagem. Não se sabe em que lugar do cérebro ela ocorre nem como é transmitida para a fala.

Chomsky compara esse desconhecimento com o acerca da ação voluntária. "Você decide levantar do dedo. Ningu[em, sabe como isso é possível; até hoje não temos a menor ideia". 

E faz uma anologia. "É como se estivéssemos começando a entender a maionete e as cordas, mas ainda não soubéssemos nada sobre o titereiro", a pessoa por trás dos bonecos.

Não é uma estupeidez espantosa, pois nem sabemos o que é o vermelho. "Você pode descrever o que os órgãos sensoriais estão fazendo, o que está acontecendo no cérebro, mas isso não captura a essêncioa de ver algo vermelho. Será quem um dia iremos capturá-la? Talvez não. É simplememnte algo que está além das nossas capacidades congnitivas".

O ceticismo de Chomsky ecoa o método de Newton, que concebeu a teoria da garvitação, mas evitou várias perguntas. "Por exemplo: como é o mundo? Qual é a natureza dele? Talvez jamais consigamos compreender essa questão. Newton deixou-a de lado. Até onde sabemos, estava certo".

Contudo, a descoberta de Chomsky foi um avanço e tanto. Andrea Moro a explica assim: "a ligação entre a estrutura da linguagem e o cérebro é tão revolucionária que nos leva a uma supreendente conclusão, que pod ser expressa de um modo que reverte a perspectiva tradicional de 2.000 anos. Foi a carne que se tornou logos, e não o contrário".

A inteligência artificial ordena o que está contido nos "bi data", os bilhões de informações dos supercomputadores. Por reiterarem os discursos dominantes, as formulações feitas pela IA têm um limite evidente: não podem se equiparar à criatividade humana.

Por isso, a inteligência artificial não expressa o novo. É incapaz de um vaticínio como o de Lincoln em Gettysburg: " que o governo do povo não desapareça nunca da face da Terra".

Tampouco pode ser onírica como Martin Luther King Jr. aos pés da estátua de Lincoln: eu tenho um sonho - meus filhos viverão um dia numa nação onde serão julgados pela cor da pelo, mas pelo caráter.

Fonte: Mário Sergio Conti / Jornalista / Jornal Folha de S. Paulo

(SJRP)

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