A Royal Enfield Bullet 500 chegou em 2017 e já saiu de linha. Virou item colecionável
Quando a Royal Enfield entrou no Brasil, em 2017, começou com um produto que fez mais sucesso pelo estilo do que pelas qualidades propriamente ditas, a Bullet e a Classic 500. Com o mesmo visual das inglesas dos anos 1950, elas prometiam um charme vintage com tecnologia de injeção eletrônica e freios ABS.
Para entender estas motos de 500 cc é preciso se imaginar dentro das roupas do seu avô, pilotando uma moto dos anos 1950, nas estradas e no estilo daquela época. Não adianta querer julgá-la baseado nos critérios das motos modernas, porque ela é uma moto inglesa antiga, com a enorme vantagem de não se tratar de uma réplica, mas de uma autêntica, zero quilômetro, original de fábrica!
Mas tem os benefícios dos tempos atuais como partida elétrica e injeção eletrônica. Mas os tiques das motos antigas como o motor muito barulhento. O motor de partida só é acionado com o cavalete lateral recolhido. Se estiver abaixado ela não libera a partida nem com a embreagem acionada. É preciso colocar no neutro.
O motor produz um ruído bem diferente, típico dos motores com comando no bloco e acionado por varetas (OHV). Na verdade o tic-tic-tic que ouvimos vem também do descompressor para acionar o pedal de partida. Sim, ela tem o pedal e eu fiz questão de tentar – e conseguir – fazê-la funcionar pelo kick-starter.
O projeto dessa moto data de 1932, quando surgiu na Inglaterra pré-Guerra e foi produzida em solo inglês até 1956, ano que a linha de montagem foi transferida para a Índia e permanece até hoje.
A Royal Enfiled moderna está para os indianos assim como os nossos carros dos anos 1980 está para o brasileiro sem grana para um carro moderno. O que para nós pode parecer algo antigo e anacrônico, para eles é a oportunidade de alcançar o sonho de consumo de toda uma família.
Como é
Vale a pena passar um tempo olhando os detalhes. Quase tudo é feito do mais puro, pesado e duro ferro! Não tem peças plásticas (exceto os punhos). Por isso o peso seco chega a quase 190 kg.
Um detalhe que chama atenção é o par de luzes ao lado do farol, chamado de olhos de tigre. Elas permanecem acesas quando se aciona a ignição e além de muito charmosas lembra a legislação de alguns países que obriga a manter os piscas dianteiros acesos junto com o farol. Para completar, como a cereja do bolo, o farol tem uma pestana de metal, exatamente como antigamente.
Olhando mais um pouco podemos ver que não existe absolutamente nenhuma frescura. Tudo é funcional e necessário. As rodas são raiadas de aço que calçam pneus com câmera Metzeler de 19” na frente e 18” atrás, na discreta medida 90/90 e 110/80, respectivamente.
O desenho do motor é totalmente clássico com o único cilindro bem na vertical e até pode-se observar as borrachas entre as aletas de arrefecimento na tentativa de reduzir a vibração. Aliás, quem não gosta de sentir a vibração de um monocilindro de 499 cm3 arrefecido a ar com comando por vareta nem chegue perto dessa moto.
A posição de pilotagem é a mais clássica possível: as pernas ficam em ângulo quase reto, com os pés bem repousados para a frente, como em uma moto utilitária. O guidão é largo e confortável. No modelo Bullet o banco é inteiro, em dois níveis. Já nas versões Classic os bancos são divididos e o espaço pra garupa é ruim e duro. Na verdade esse “projeto de banco” foi feito para ser retirado mesmo.
Como anda
Nos corredores entre os carros dá um pouco de trabalho por causa da largura do guidão. Na verdade o guidão nem é tão largo, mas ele tem os pesos na ponta que servem para reduzir a vibração nas manoplas.
A caixa de câmbio de cinco marchas tem um acionamento suave e silencioso. E quando se engata a quinta, acima de 40 km/h, o funcionamento do motor se torna suave, silencioso e sem vibrações. Parece mágica. Mas basta elevar a rotação para sentir mãos e pés formigarem.
Na estrada, até 100~110 km/h o motor se mantém no limite aceitável de vibrações, mas acima disso a vibração é tão intensa que não dá para ver o que está se passando pelos espelhos.
Já no trecho de curvas, nada a declarar. Nem pense em pilotá-la como se fosse uma esportiva, porque o chassi é pesado, torce e as pedaleiras raspam no asfalto com facilidade. É preciso enfrentar as curvas como se realmente estivesse nos anos 1950.
Neste percurso sinuoso pudemos avaliar o freio dianteiro a disco, muito eficiente, mas que merecia manete regulável, porque depois de algumas frenagens seguidas a mão direita cansou. É fácil de resolver com uma manete regulável vendida no mercado de acessórios. Já o freio traseiro a tambor é suficiente para controlar a velocidade no uso urbano.
E como a Royal Enfield venceu o Six Days Scottish Trial, em 1957, com Johnny Brittain pegamos uma estrada de terra e a Bullet surpreendeu positivamente porque o motor tem uma entrega de potência tão suave que mesmo abrindo o acelerador ela não sai chicoteando pra todo lado. Parece até um controle de tração. Pode-se afirmar que é possível enfrentar longos trechos de terra até porque na Índia as estradas de asfalto são um luxo das cidades industrializadas.
As suspensões aceitaram bem o piso irregular. Trata-se de um conjunto simples, com garfo telescópico na frente e dois amortecedores reguláveis atrás.
Outro destaque é o jogo de ferramentas, como antigamente, com chaves de bom tamanho, resistentes e funcionais. Não estão ali só para cumprir exigências burocráticas.
Charme e classe
A má notícia é que a Royal Enfield decidiu interromper a venda destes modelos no Brasil em 2020. Isso, mais a conjuntura estranha, fez os preços das usadas enlouquecerem de tal forma que variam de R$ 17.500 até R$ 36.000. Algumas edições especiais, como a Tribute Edition podem encostar em R$ 40.000.
Normalmente o modelo Bullet, de banco inteiro, é menos valorizada, enquanto a versão classic, principalmente as especiais como a militar, são mais valorizadas.
Mas claro que é uma moto de nicho, para quem sabe que se trata de uma antiga em corpo de moderna. O motor tem pouca potência (tem 27,2 CV a 5.250 RPM), e gasta mais do que uma 250 moderna (faz cerca de 24 km/litro).
Um dos apelos da Bullet é a facilidade de customização. A exemplo da Harley Davidson, estas Royal tem uma coleção de acessórios para deixa-las todas diferentes. E mais: qual moto vendida no Brasil é fabricada praticamente à mão, uma por uma? Faz muito sucesso o vídeo do artista que pinta os filetes dos tanques à mão. Se não viu, veja abaixo:
Se a ideia for uma moto urbana, que se destaca, imune a roubo, charmosa e com uma extensa lista de acessórios customizáveis, pode procurar uma. Já imagino uma série de acessórios como mata-cachorro, luzes de neblina, bolsas laterais de couro, sem falar na linha de roupas da marca Royal Enfield, 100% de inspiração vintage.
Como elas tem pouco tempo de mercado, as unidades usadas à venda normalmente estão pouco rodadas. Os itens a serem observados nas usadas são os já conhecidos de sempre: vazamentos em geral (motor, retentor das bengalas e cárter). Também o kit de relação de transmissão: corrente, coroa e pinhão. Por ser uma moto de concepção rústica, pode ser comum pontos de ferrugem.
Não se preocupe com peças de reposição, porque hoje é possível achar tudo pela internet.
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